A Predestinação Uma Reflexão

Data publicação 28/01/2016

A Predestinação – Uma Reflexão

“Porque o que dantes conheceu, também os predestinou” (Rm. 8:28).

 

A doutrina da predestinação é uma das mais difíceis de toda a Bíblia. Ela se baseia na onisciência de Deus, em Sua soberania, sem desrespeitar a liberdade, o livre arbítrio do homem. A harmonização de todos estes elementos não é tarefa fácil.

Humanamente falando é praticamente impossível entender a predestinação. Deus é um ser que não conseguimos compreender plenamente. Temos as nossas limitações para conhecê-lo e entender o Seu agir. “Agora vemos por espelho em enigmas” (I Co. 13:12).

Quem governa o curso da história? Para alguns é Deus, para outros são as próprias pessoas. Se Deus dirige o curso da história, se ele pode interferir e mudar o rumo de acordo com o Seu propósito, então, como podemos falar de livre arbítrio?

Mas se são as pessoas que dirigem o curso da história e determinam o seu fim, como podemos orar a Deus e confiar que Ele possa mudar a nossa vida e a nossa história?

Se nós somos os autores finais, então Deus não é o Soberano Senhor do Céu e da terra e de tudo que neles há, e é uma inutilidade a fé, e igualmente inútil é orar para que Ele mude as coisas em nossa vida e a nossa própria vida.

Como se pode observar a predestinação é um tema espinhoso. Não se trata de algo exclusivo da cultura judaico cristã. Os gregos, entre outros povos antigos, criam que as pessoas nasciam predestinadas. Eles criam que as pessoas podiam conhecer os seus destinos com o auxílio dos deuses e seus sacerdotes e sacerdotisas.

Uma das histórias gregas mais conhecidas que trata da predestinação é a do rei Édipo, que no anseio de fugir de seu destino, terminou correndo em direção a ele. Seus pais, Laio e Jocasta, sabiam, através de um oráculo de Delfos, no templo de Apolo, que o filho estava predestinado a matar o seu genitor e casar-se com a sua genitora e com ela gerar filhos.

Quando Édipo nasceu os seus pais lhe furaram os pés e o amarraram com uma correia de couro e ordenaram um escravo para que o abandonasse longe de Tebas, a cidade onde moravam.

O escravo, agora distante, deixou a criança aos cuidados de um pastor e sua esposa. Estes, na cidade de Corinto, entregaram a criança à rainha de Corinto e ao seu marido, Mérope e Pólibo, que não tinham filhos, e por causa disto adotaram Édipo, e cuidaram dele como o sucessor do trono.

Ao crescer Édipo descobre, com base no oráculo de Delfos, no templo de Apolo, que ele estava predestinado a matar seu pai e a desposar a sua mãe. Com base nesta revelação Édipo decide deixar Corinto as presas para evitar tamanha desgraça. Cansado de tanto caminhar ele adormece no meio do caminho. Ao ser acordado por Laio, rei de Tebas, de maneira rude, Édipo se atira com ódio, com a espada em punho, e mata o seu pai sem o saber, bem como os poucos soldados que o acompanhavam.

Depois de sangrenta luta, Édipo se encaminha para Tebas, a terra de seus verdadeiros genitores. A cidade estava sendo destruída por causa de um enigma proposto pela Esfinge o qual nenhum habitante conseguia decifrar.

A solução do enigma traria paz e prosperidade para a cidade. Édipo foi ao encontro do monstro para acabar com o castigo que assolava o povo de Tebas. Caso Édipo não soubesse responder ao enigma, ele, então, seria morto. De pronto a Esfinge lhe disse, com ironia, o enigma: qual é o animal que tem quatro pés de manhã, dois pés ao meio-dia, e três pés à tarde? Édipo respondeu prontamente: o homem, pondo, assim, fim ao sofrimento na cidade de Tebas.

Por causa da inteligência e coragem de Édipo, ele foi coroado rei, casou-se com a viúva, sua mãe, ainda sem o saber. Com ela teve dois meninos e duas meninas.

Mais tarde, ao tomar conhecimento de que havia matado o seu próprio pai e casado com sua mãe e com ela  gerado filhos e filhas, Édipo cegou-se, para no hades não poder ver seus pais e filhos.

Assim, de forma dolorosa, ele aprendeu que não podia fugir da predestinação, que os oráculos sempre se cumprem, os deuses sempre estão certos.

A predestinação era ensinada em todas as culturas. A Bíblia também ensina a predestinação: “Porque o que dantes conheceu, também os predestinou” (Rm. 8:28).

A revelação Bíblica ensina que temos alguma liberdade, mas ela tem o seu limite na vontade soberana de Deus. Vejam o caso do oleiro e do barro e do vaso. Deus é o Oleiro, nós somos o barro. Somos menos que pensamos ser. Podemos menos que acreditamos poder. Nossa ignorância excede nosso conhecimento. É uma pena que ignoremos isto. Como seria bom caso vivéssemos conscientes da máxima socrática: Só sei que nada sei.

“Porque diz a Escritura a Faraó: Para isto mesmo te levantei; para em ti mostrar o meu poder, e para que o meu nome seja anunciado em toda a terra.

Logo, pois, compadece-se de quem quer, e endurece a quem quer.

Dir-me-ás então: Por que se queixa ele ainda? Porquanto, quem tem resistido à sua vontade?

Mas, ó homem, quem és tu, que a Deus replicas? Porventura a coisa formada dirá ao que a formou: Por que me fizeste assim?

Ou não tem o oleiro poder sobre o barro, para da mesma massa fazer um vaso para honra e outro para desonra?” (Rm. 9:17-21; Jr. 18:1-6).


O nosso pé tem alguma liberdade, mas ele não pode ser a mão. Ele pode se movimentar de acordo com as suas características. O leão vive de acordo com a sua natureza, e a andorinha também.

Uma criança engatinha com cerca de um ano. Aos dois anos a criança corre e aponta com entusiasmo para tudo o que vê. Aos sete começa a ler e escrever. Aos quinze, diante do espelho, ela descobre que não é mais criança e começa querer tomar suas próprias decisões, ignorando que ela pensa e age de acordo com sua própria natureza, suas glândulas, seus hormônios. 

Temos a liberdade para desenvolver todas as nossas potencialidades inerentes. Porém, há um detalhe que não deve ser olvidado: Uma mangueira não terá a opção de produzir mamão.

Deus criou todas as coisas e as leis que regem todas elas. É claro que Ele está acima de tudo e de todos. Mas, de uma forma geral, tudo está sujeito às leis do Eterno, as quais regem o universo e tudo o que nele há.

Dependendo do solo, uma macieira não pode produzir boas maçãs. O mesmo acontece com uma criança. Dependendo dos pais, da alimentação, da escola, dos professores, da igreja, do pastor, da sociedade, ela poderá crescer e ser luz. Mas, poderá, também, ser obstruída, tolhida, castrada, e, ao invés de ser luz, ela será trevas.

Somos dependentes de nosso potencial interno e externo. Somos regidos por leis internas e externas. Só o Soberano Senhor é total e plenamente livre para agir de forma totalmente independente. O Senhor não é vitima das loucuras humanas. Ele tem tudo sob o Seu controle desde o início de todas as coisas.

“Levantaram-se os reis da terra, e os príncipes se ajuntaram à uma, contra o Senhor e contra o seu Ungido.

Porque verdadeiramente contra o teu santo Filho Jesus, que tu ungiste, se ajuntaram, não só Herodes, mas Pôncio Pilatos, com os gentios e os povos de Israel.

Para fazerem tudo o que a tua mão e o teu conselho tinham anteriormente determinado que se havia de fazer” (At. 2:26-28).

A predestinação requer mais do que simplesmente compreensão cognitiva. Ela demanda fé em um Deus que é Soberano, mas não tirano. Ele é Justo, Santo e Bom. Seu  Ser e o Seu agir estão muito além de nossa inteligência.

A fé que precisamos ter nele deve ser produto não do medo, mas uma resposta como de uma criança, humilde, fruto de nosso amor a Ele. Ele nos amou primeiro.

"Nós o amamos, porque Ele nos amou primeiro" (I Jo. 4:19).

“Mas Deus prova o seu amor para conosco, em que Cristo morreu por nós, sendo nós ainda pecadores” (Rm. 5:8).

Diante da doutrina da predestinação somos tentados a duvidar do caráter de Deus e pensar que nele habita, também, as trevas. Mas, Ele é o Pai das Luzes. E nele não há sombra de variação (Tg. 1:17). "Eu, o Senhor, não mudo" (Ml. 3:6). O caráter de Deus não muda: Ele é justo, bom, paciente, soberano, etc. Quando a Bíblia fala do arrependimento de Deus (Gn. 6:6, 7; I Sm. 15:11; Jl. 2:14), trata-se de uma linguagem bíblica conhecida como antropomorfismo, que consiste em descrever em termos humanos tanto fisicamente como emocionalmente. O arrependimento de Deus na Bíblia não deve ser entendimento literalmente como o arrependimento do ser humano: arrependimento de pecado, do erro.

Estamos condicionados a ver as coisas de uma perspectiva espacial e temporal. Nossa interpretação da vida depende de termos nascidos no Brasil ou na Rússia, em 1956 ou em 1056, ou em 3056. Não sabemos, com certeza absoluta, como o mundo é em si. Só sabemos como o mundo é para cada um de nós.

Como seria bom caso pudéssemos aprender, pela fé, a ver as coisas sob a perspectiva da eternidade, de Deus! Viveríamos menos ansiosos. Descansaríamos no Eterno, que tem os tempos e os espaços em Suas Mãos.

Pois, o Senhor não tem prazer na morte do ímpio. O que alguns podem pensar erroneamente com base numa compreensão errada da predestinação. Ele é longânimo e não quer que ninguém se perca, senão que todos venham a arrepender-se e pela fé em Seu Filho Jesus Cristo serem salvos (II Pd. 3:9; At. 17:30-31).

A doutrina da predestinação não anula o amor de Deus por todos os homens. E Ele amou tanto o mundo que deu seu filho,  seu único filho,  para que ninguém precise ser condenado, para que  todos crendo nele, possam ter vida plena e eterna, serem felizes e fazerem outros também felizes, no tempo e na eternidade.

Pastor Washington Roberto Nascimento.