Uma breve reflexão no Salmo 137

Data publicação 19/03/2025

Uma breve reflexão no Salmo 137

Pastor Washington Roberto Nascimento

O Salmo 137 é um lamento de saudade de uma comunidade arrancada de casa. Em 586 a.C., o império babilônico conquistou Jerusalém, destruiu o primeiro Templo que havia sido construído pelo Rei Salomão e desenraizou um grande número de pessoas, deportando-as para centenas de quilomêtros de distância. Essa tragédia é lamentada no salmo 137, que inclui versos famosos como "Junto aos rios da Babilônia" e "Se eu me esquecer de você, ó Jerusalém".

Este salmo 137 é bem conhecido da liturgia judaica e da liturgia e cultos das igrejas cristãs. É inegável o seu valor em nossas vidas e sua influência na música clássica e na música popular.

O compositor alemão, Johann Sebastian Bach (1685-1750), escreveu uma composição executada ainda hoje em vários lugares, nos mais diferentes países. No link abaixo há informações preciosas sobre as variações criadas pelo próprio Bach para tocar e cantar a sua composição baseada no texto bíblico: Salmo 137 (- Van Doeselaar on Bach An Wasserflüssen Babylon BWV 653 | Netherlands Bach Society -).

A canção popular baseada no Salmo 137 e no Salmo 19:14, é conhecida e cantada pelas mais diferentes pessoas, nos mais diferentes lugares. Estamos falando da canção reggae dos anos de 1970. O nome em Inglês é: "Rivers of Babylon" - Rios da Babilônia. É uma canção Rastafari. Rastafari é um movimento religioso, cultural e social que nasceu na Jamaica. A música: Rivers of Babylon – foi escrita e gravada por Brent Dowe e Trevor McNaughton do grupo de reggae jamaicano The Melodians em 1970. A versão original da canção do grupo: The Melodians, apareceu no álbum da trilha sonora do filme The Harder They Come de 1972, que a tornou conhecida internacionalmente. Esse filme foi dirigido por Perry Henzell. Lançado dez anos após a independência da Jamaica, trata da história de Henzell e do dramaturgo jamaicano Trevor Rhone. É um relato ficcional da vida real de Ivanhoe “Rhygin” Martin (- https://www.youtube.com/watch?v=BXf1j8Hz2bU).

A canção foi repopularizada na Europa pela versão cover de Boney M. de 1978, que recebeu um disco de platina e é um dos dez singles mais vendidos de todos os tempos no Reino Unido (- https://www.youtube.com/watch?v=l3QxT-w3WMo -).

O Salmo 137 é recitado na véspera de Tisha B'Av, que lembra a destruição de ambos os Templos. Tisha BeAv é o dia do calendário judaico, no qual foi fixado dia de jejum e de luto devido a dois dos trágicos eventos da história judaica: a destruição pelo Império Babilônico do Templo de Salomão, em Jerusalém, no ano 586 a.C., e a destruição do Segundo Templo, no ano 70 d.C., pelo Império Romano, entre outros eventos trágicos contra o povo judeu, alguns até de um passado recente.

Tisha B'Av cai em julho ou agosto no calendário gregoriano. Quando Tisha B'Av cai no Shabat (o sábado), então é adiado. Assim, a observância de Tisha B'Av pode ocorrer no dia seguinte, ou seja, domingo.

O Salmo 137 expressa a dor do exílio, da terra de Israel, de forma profunda. O salmo é curto — apenas nove versos — e pode ser dividido em três partes, cada uma com seus próprios temas e desafios para os anseios espirituais de hoje. Os quatro primeiros versos são lidos da seguinte forma:

1. Junto aos rios da Babilônia, ali nos assentamos e choramos, quando nos lembramos de Sião.

2 Sobre os salgueiros que há no meio dela, penduramos as nossas harpas.

3 Pois lá aqueles que nos levaram cativos nos pediam uma canção; e os que nos destruíram, que os alegrássemos, dizendo: Cantai-nos uma das canções de Sião.

4 Como cantaremos a canção do Senhor em terra estranha?

Nessas linhas de abertura, podemos ouvir o sadismo dos moradores locais. Eles zombam dos israelitas recém-chegados: “Cante para nós um desses cânticos espirituais de sua terra”. A resposta israelita, “Como podemos cantar em solo estrangeiro, longe da nossa teera?” A resposta reflete uma perda não apenas material, da terra, mas uma perda espiritual, do lugar de culto, de louvor, de estudo da Palavra do Senhor, uma perda de conexão com o Eterno. Será que Deus ouvirá os nossos louvores em terra estranha? Será que Ele está aqui conosco, neste sofrimento? Cria-se em Israel que o Senhor habitava no templo, no Santo dos santos.

No exílio, no vale da sombra da morte, em meio a dor, no vale dos ossos secos, no fundo do poço, corremos o risco de sofrer de saudade de Deus, de sua presença. Na terra “estranha” sofremos por causa da distância não apenas física, mas espiritual: dos louvores, do culto, da adoração, do próprio Deus.

O Salmo 137 fala dessa dor, dessa solidão, dessa distância triste.

A segunda parte do Salmo137 diz assim:

5. Se eu te esquecer, ó Jerusalém, que minha mão direita murche;

6. que minha língua grude no meu palato se eu deixar de pensar em ti, se eu não mantiver Jerusalém na memória mesmo na minha hora mais feliz.

Aqui, a dor da perda se transforma, miraculosamente, em uma declaração de amor. O salmista não se esqueceu e não vai se esquecer de Jerusalém por causa de tudo o que ela representa para ele! O Templo em Jerusalém era o lugar onde Deus e o povo se encontravam. Era o lugar da comunhão com Deus e com o Seu povo. A memória desse encontro, desse culto, desse louvor, dessa transcendência  naquele lugar consagrado é, em última análise, não um anseio por sacrifícios, mas pela koinonia com Deus e com os irmãos que a adoração evocava.

Na terceira e última parte do Salmo 137, nos versos finais, temos algo desagradável e difícil.

7. Lembra-te, ó SENHOR, dos edomitas no dia da queda de Jerusalém; como eles clamaram contra Jerusalém: Desnudai-a, despi-la até os seus alicerces!

8. Filha da Babilônia, predadora, abençoado seja aquele que te retribui na mesma moeda que que nos infligiste;

9. Abençoado seja aquele que agarra os teus bebés e os atira contra as rochas!

Essa declaração de vingança violenta destes versos é dolorosa de ler. Como seria bom caso não tivéssemos esses versos nos lábios dos filhos de Deus! Jesus nos ensina agir e reagir em outro nível! Como é fácil agir e reagir no nível animal! Como é possível agir e reagir no nível humano! Como é difícil agir e reagir no nível de Jesus Cristo, nosso salvador e mestre! Ele nos ensinou amar os nossos inimigos, orar pelos que nos perseguem e fazer bem aos que nos maltratam! (Mt. 5:44).

Creio que há pessoas que só leem o Salmo 137 até o versículo 6, que fala sobre manter viva a memória de Jerusalém.

O que podemos fazer com o Salmo 137:7-9?

Creio que não devemos validar a  vingança violenta, mas podemos procurar compreendê-la. O texto bíblico não afirma que alguém alguma vez tenha feito essas coisas horríveis.

Essas palavras finais do Salmo 137 refletem a raiva da vítima, a sua enorme dor e sua total sinceridade e honestidade diante de Deus. Os sentimentos aqui revelados nos ajudam a entender pessoas e povos que sofrem as mais diferentes e terríveis formas de opressão, nos mais diferentes lugares, ainda hoje.

Outra lição que o Salmo 137 nos ensina é que, não importa onde estejamos, vivemos, espiritualmente, em um estado de exílio. Temos saudades de Deus, da presença dele. Ansiamos por uma reconciliação com Deus e com o próximo também.

Jesus Cristo, o Filho de Deus, é tanto o agente dessa reconciliação com o Senhor e com o nosso irmão que nos fez mal. Ele nos capacita e ensina, por meio de Seu Santo Espírito, a vencer o mal com o bem. Para tanto, sem dúvida, é preciso nascer de novo (Jo. 3:1-7).

Um  forte abraço.

Pastor Washington Roberto Nascimento.