Alguns elementos da História da Bíblia - Uma breve reflexão
Pastor Washington Roberto Nascimento
Introdução
Na história bíblica nós temos alguns elementos básicos e importantes para uma leitura inteligente e proveitosa. Esses elementos que fazem parte da história bíblica são: o tema; os personagens; o cenário; o enredo; o conflito (a trama, o perigo, o risco, a ameaça, o suspense) e a resolução. A seguir vamos apresentar algumas breves considerações sobre cada um desses elementos.
1. O Tema da Bíblia
O principal tema da Bíblia é Deus, mas há subtemas: O Amor de Deus; O Reino de Deus; A Salvação de Deus; As Promessas de Deus; As Alianças de Deus; A Vida da Humanidade (Adão e Eva); A História do Pecado. Etc. O tema e os subtemas encontram-se presentes de maneira explicita ou implícita em cada uma das páginas da história bíblica.
A consciência de um tema geral e de seus subtemas pode nos ajudar na leitura, no estudo, no entendimento e na aplicação das lições presentes na História da Bíblia.
2. Os Personagens
O principal personagem da História da Bíblia é Deus. No grande drama da história da criação e redenção, o principal personagem é o Senhor, cuja face o Seu Filho, o Senhor Jesus Cristo, revelou. Ele é o protagonista em torno de quem a história gira. Ele é o personagem gerador, criador e transformador de toda a história, que dá sentido, harmonia e final feliz.
Contudo, é importante que se diga, há mais de três mil personagens (cerca de 3237 nomes de pessoas) na história bíblica. Há nomes que tem apenas uma menção passageira e nada mais. Contudo, há alguns que se imortalizaram. Foram especiais na história que podemos ler no texto bíblico.
Os personagens que se destacam quando estudamos a Bíblia não são poucos. Eles são apresentados com suas virtudes e defeitos. Adão e Eva (que podem significar: Adão – no hebraico - אָדָם – (lê-se: `adam) - humanidade + Eva - חַוָּה – (lê-se: rrauvar) - vida – a vida da humanidade), Noé, Abraão, Isaque, Jacó, José, Moisés, Josué, Samuel, Saul, Davi, Salomão, Elias, Eliseu, Isaías, Jeremias, Ezequiel, Daniel, Oséias, Joel Amós, Obadias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuque, Sofonias, Ageu, Zacarias, Malaquias, Pedro, João, Tiago, Paulo, Lucas, Timóteo; e não apenas os homens, mas, muitas mulheres também: Miriam, Débora, Ana, Rute, Ester, Maria, a mãe de Jesus; Maria e Marta, irmãs de Lázaro; Isabel, a esposa de Zacarias e mãe de João Batista; Tabita, conhecida também como Dorcas, discípula de Jesus Cristo (At. 9:36-43); entre tantos outros nomes. A lista é enorme. Temos aqui apenas alguns destaques sem a pretensão de ser uma lista perfeita ou completa. Trata-se apenas de uma lista a título de exemplo/sugestão para que você possa completa-la, aperfeiçoá-la.
Há muitos outros personagens na Bíblia que nos são apresentados de maneira explicita como maus ou bons. Há, inclusive, uma expressão repetida várias vezes nos livros dos Reis para descrever personagens políticos nos reinos de Israel – Reino do Norte (também conhecido como: Israel) e Reino do Sul (também conhecido como: Judá) - que fizeram o que era mau aos olhos do Senhor (I Rs. 14:22); ou fizeram o que era reto/bom aos olhos do Senhor (II Rs. 18:3). Podemos usar uma dessas expressões para vários personagens da História da Bíblia desde Gênesis até Apocalipse. Adão e Eva fizeram o que era mau aos olhos do Senhor, e o filho deles, Caim, fez, também, o que era mau aos olhos do Senhor. A lista é enorme; e, para a nossa surpresa, aprendemos que muitas vezes até mesmo os servos de Deus fizeram não apenas o que era reto/bom aos olhos do Senhor; eles, também, fizeram o que era mau aos olhos do Senhor: Abraão, Moisés, Davi, Pedro, etc. Eles eram semelhantes a você e a mim.
Muitas vezes o escritor apenas registra o que o personagem fez ou falou e cabe a nós decidir se aquilo foi bom ou mau aos olhos do Senhor. Poucas vezes temos informações sobre os aspectos físicos dos personagens, como altura, cor da pele, cabelo, etc.
Às vezes os personagens são apresentados com traços bem complexos. Homens de Deus fazem coisas horríveis, más, como se de Deus não fossem. Noé se embriagou (Gn. 9:18-28); Abraão, o pai da nação de Israel, nosso pai na fé, tinha sua escrava Agar como mulher e com a permissão de sua esposa Sara (Gn. 16:1-4); além disso, Abraão também mentiu dizendo que Sara era sua irmã e não sua esposa, para um rei de uma certa região na Palestina, que tinha como título Abimeleque (Gn. 20); a mesma coisa fez seu filho Isaque (Gn. 26:1-11). Moisés, matou um homem e fugiu do Egito como medo de Faraó (Êx. 2); Davi, o rei segundo o coração de Deus adulterou e matou o marido de sua amante; pecou contra Deus, contra o povo do Senhor e o exército de Israel (II Sm. 11). Nos faltaria tempo para falar de muitos outros, inclusive dos apóstolos de Jesus. Paulo foi um homem violento e participou da morte de Estevão (At. 7, 8); Pedro negou conhecer a Jesus (Mc. 14:66-72; Mt. 26:69-75; Lc. 22:54-62; Jo. 18:15-18, 25-27); Tomé duvidou da ressurreição de Jesus (Jo.20:24-25). A lista é enorme.
Em tudo isso, em toda a história bíblica, na vida de cada um de seus personagens, nós vemos Deus, o personagem principal desta história dramática, cheio de amor, de graça de paciência para com todos os homens, a despeito de suas falhas. Ainda hoje é assim. Ele não muda. Ele é o mesmo (Hb. 13:8). Ele nos ama e quer nos salvar, nos transformar em uma nova criatura.
A minha oração é que esta breve reflexão sobre os personagens na Bíblia sirva não apenas para informação, mas para a transformação de sua vida. E isso só é possível porque entre todos os personagens na Bíblia, o mais importante é Deus, e, é claro, o Seu Filho, o Senhor Jesus Cristo e, é claro, o Espírito Santo, que é apresentado na Bíblia como uma pessoa que tem vontade e que é Deus, é um como Pai e o Filho (Mt. 28:19; Jo. 14:16-17; Ef. 4:30; etc.).
Deus nos ama e está pronto para nos perdoar, para que nós, também, possamos amar outras pessoas e perdoá-las ao longo do caminho. É assim que Deus está criando uma nova humanidade em Cristo Jesus, marcada pela capacidade de amar e perdoar a todas as pessoas.
Aprendemos na história da Bíblia que todos os personagens falharam, exceto o Senhor. Eles foram homens sujeitos as mesmas paixões que nós. Todos pecaram como você e eu.
Nem eles, nem nós, vivemos como deveríamos viver, de acordo com os ensinos da Palavra de Deus e de Jesus Cristo, a Palavra que se fez carne e habitou entre nós.
Quando estudamos os personagens bíblicos podemos nos perguntar com qual deles nos identificamos, isto é, somos parecidos: com Caim ou Abel; com Judas, que traiu a Jesus ou com João, o apóstolo que estava ao pé da Cruz, ao lado da mãe de Jesus?
Certamente que os personagens bíblicos servem como espelhos onde podemos nos ver em alguma medida.
O que Deus, porém, deseja com essa história arrebatadora e fascinante é que procuremos viver como o Filho dele, o Senhor Jesus Cristo. Pois, assim vivendo, daremos alegria ao Pai, seremos felizes e faremos outros também felizes, no tempo e na eternidade, tanto na terra quanto no céu.
3. O Cenário
O cenário diz respeito ao ambiente, a localização, ao tempo, a geografia, aos aspectos socioeconômicos, políticos, psicológicos, espirituais, e tudo isso relacionado ao enredo, a narrativa.
A ação e as falas dos personagens bíblicos aconteceram em determinado lugar e tempo, é isso que chamamos de cenário bíblico.
No cenário bíblico temos lugares como a mesopotâmia, onde estavam a Babilônia e a Assíria, onde até hoje temos os rios Tigre e Eufrates, que são mencionados em Gênesis 2.
Atualmente o Iraque, o Irã e a Jordânia se encontram na Mesopotâmia.
Abraão saiu da Mesopotâmia e foi para Canaã, em obediência a Deus (Gn. 11; 12).
O Reino do Norte de Israel foi destruído pelo Império Assírio; e o Reino do Sul pelo Império Babilônico (II Rs. 17; 25).
Há outros lugares notáveis que marcaram o cenário bíblico e consequente toda a revelação de Deus. O Egito, a terra de Israel, onde temos o Rio Jordão, Belém, Jerusalém, etc., o Império Persa que também dominou Israel e que atualmente é o Irã, e encontra-se presente como cenário dos livros de Esdras, Neemias e Ester.
O Império da Grécia, o helenismo, a língua, a filosofia, Atenas, Corinto, etc. Tudo isso faz parte do cenário bíblico e é de uma relevância indiscutível para a compreensão da história da Bíblia.
O Império Romano, sua capital, a cidade de Roma, e seus imperadores e leis e províncias não podem ser negligenciados. A história bíblica, em especial o Novo Testamento, tem lugar dentro desse cenário tão fascinante.
O cenário da história de Deus na Bíblia não é só na terra, é no céu também. As coisas acontecem no reino terreno, físico; e, também, no reino espiritual, metafisico, e no coração das pessoas. O estudante da Bíblia não deve olvidar esse cenário invisível aos olhos humanos, mas real e decisivo.
4. O Enredo – (a narrativa)
O enredo diz respeito as falas e as ações, dos personagens em seus ambientes. O enredo Bíblico tem a ver com o texto que lemos na história bíblica com vários estilos literários e com os conflitos, os dramas entre os mais diferentes personagens e nos mais diferentes cenários.
Podemos encontrar em um mesmo livro diferentes estilos literáros: lei, históira, poesia, literatura sapiencial, apocalíptica, profética, evangelho, epístola, parábolas, etc. Esse saber é fundamental para uma compreensão do texto, da mensagem, da história da Bíblia.
É importante, também, estar atento para as figuras de linguagem ao londo do enredo, das narrativas. Na História Bíblia temos muitas metáforas, símiles, analogia, ironia, antropomorfismo, etc. Ignorar isso, é erro grave para uma boa compreensão da história.
As narrativas da História Bíblica estão cheias de tensões, conflitos, envolvendo os personagens. São conflitos com dimensões sociais, políticas, materiais e espirituais, físicas e metafísicas, entre o bem e o mal, as bênçãos e as maldições, a vida e a morte, o pecado do homem e a santidade de Deus, a necessidade de redenção do homem e o amor e a justiça de Deus.
Há no enredo palavras chaves que podem ajudar o leitor da Bíblia a entender a sua mensagem. Palavras tais como: Deus e Senhor, por exemplo. Deus - אֱלהִים - aparece 2598 vezes no Antigo Testamento. E o nome de Deus, o Senhor - יְהוָֹה – aparece 6220 vezes no texto original hebraico do Antigo Testamento. No Novo Testamento Grego, a palavra Deus – θεός - aparece 1327 vezes. E a palavra Senhor - κύριος - 722 vezes. Assim sendo, aprendemos que o número tão alto e incomparável das palavras: Deus e/ou Senhor na Bíblia é sinal inequívoco de que, de fato, o tema desta história bíblica e o seu personagem principlal não é outro, senão Deus, o Senhor.
5. O Conflito (Suspense/problema)
Sem o conflito, o perigo, a tensão, a trama, o perigo, temos apenas uma reportagem ou informação. Quando lemos: Maria levou um bolo para a sua avó, temos apenas um relatório, uma informação. Mas quando lemos: Maria levou um bolo para a sua avó e havia um lobo mal escondido no caminho. Aí temos uma história com um enredo, uma narrativa, rica, interessante, dramática, tensa.
Há na história bíblica um elemento que gera e alimenta a trama, o suspense, o perigo, o conflito, o problema do homem em relação a Deus, ao seu próximo e a si mesmo. Este conflito ou problema tem a ver com a escolha errada do ser humano, a decisão equivocada, o pecado que é a ruina da humanidade, até mesmo dos servos de Deus, de seus filhos.
Essa falha humana acarretou um dano enorme para toda a criação, para nossa família, o nosso próximo, para a terra e tudo o que nela há.
Todos nós sabemos como deveríamos viver. Mas nenhum de nós tem condições para fazer o que sabemos ser o certo. Por mais que psicólogos, médicos, sociólogos, políticos, pastores falem e escrevam sobre como viver (comer, beber, exercitar, pensar, sentir, etc.), nós simplesmente falhamos, fracassamos em nossos esforços.
Quando a Bíblia diz que enganoso é o coração (Jr. 17:9), podemos interpretar a palavra coração aqui não apenas como o centro de nossas emoções, mas como todo o nosso ser. A ideia dominante de Jeremias 17:9 é: Como eu me engano sobre tudo e o tempo todo! Trata-se de uma confissão humilde e radical do profeta, produto de sua consciência de pecado, de pecador.
O pecado é a fonte do conflito, do suspense, do problema da trama na história bíblica. E isso se encontra presente na história de todos os personagens, porque todos pecaram e separados ficaram da presença de Deus (Rm. 3:23).
6. A Resolução
A resolução ou a solução do problema do pecado, dos conflitos, das tramas, presentes no enredo, no cenário e na vida dos personagens da história Bíblica, se encontra apresentada de maneira definitiva no Novo Testamento, na Cruz de Cristo, na vida, morte e ressurreição de Jesus, o Cristo de Deus.
No Antigo Testamento temos os devidos prenúncios da solução do problema, isto é, anúncios antecipados de como o conflito será resolvido; mas os prenúncios são profecias, são apresentados também de formas simbólicas, tipológicas, figurativas, e, muitas vezes, humanamente falando, impossíveis de serem compreendidas literalmente. Só quando a solução é apresentada no Novo Testamento através da pessoa de nosso Senhor Jesus Cristo é que as coisas começam a fazer sentido.
O Novo Testamento não tem apenas a solução do conflito presente na narrativa bíblica; o Novo Testamento traz, também, uma narrativa que tem em si um conflito entre o bem e o mal, o Cristo e o Anticristo, Jesus Cristo e o falso profeta, Jesus Cristo e a antiga serpente, chamada de Diabo e Satanás (Mt.4:1-11; Ap. 12:9), e a solução de tal conflito encontra-se na resposta de fé em um Deus que é Amor, é Bom, e por isso não deixará impune o mal, Ele o vencerá e o eliminará para sempre, pois é poderoso para fazê-lo. Seu Poder nasce de seu amor. Ele não tem amor pelo poder, mas seu amor tem poder para vencer o mal.
Conclusão
Que você e eu possamos estudar esta história da Bíblia, interagir com ela, entende-la, amá-la, ensiná-la em nossa casa, no templo, no trabalho, na escola, ao longo do caminho, com palavras e ações.
A história da Bíblia é singular. É divina e humana, é terrena e celestial, temporal e eterna. Quando lemos esta história, aprendemos que precisamos tomar uma posição, somos interpelados nesse sentido.
Que você e eu possamos tomar a decisão de fazermos a vontade de Deus Pai; sermos a cada dia transformados à imagem de Jesus Cristo, Seu Filho, pelo poder de Seu Espírito Santo.